Debater o cuidado com a saúde mental de crianças e adolescentes tem se tornado cada vez mais urgente e imperativo. Para ampliar o conhecimento daqueles que fazem interface com a Rede de Atenção Psicossocial (Raps) do Estado e discutir o cuidado com o público infanto-juvenil, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) realizou, nesta sexta (17/11), o III Encontro de Saúde Mental de Criança e Adolescente. Durante o evento, foram formados profissionais replicadores das formas de cuidado em saúde mental, sob a perspectiva da integralidade e da intersetorialidade, baseado nos preceitos da Política Estadual de Saúde Mental, Álcool, e Outras Drogas, em consonância com os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Reforma Psiquiátrica Antimanicomial.
A subsecretária de Redes de Atenção à Saúde da SES-MG, Camila Moreira de Castro, destacou a importância que as temáticas relacionadas à saúde mental têm para a pasta e citou discussões realizadas nas últimas semanas, com o Ministério da Saúde e o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) sobre o assunto.
“Essa tem sido uma semana intensa, porque o tema da saúde mental provoca todos nós. Estamos muito engajados em tentar compreender e atuar, especialmente sob essa perspectiva de intersetoralidade e integralidade. Fazer esse seminário com tantos representantes, inclusive do Ministério Público, e com o apoio da Escola de Saúde Pública, é muito importante. Vamos nos aprofundar no tema e pensar nos próximos passos, para que tenhamos uma equação cada vez mais qualificada, que consiga olhar para o usuário de forma integral, considerando todas as perspectivas que cada um pode trazer para a realidade de trabalho”, disse.
Para a promotora de Justiça do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça e Defesa da Saúde do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Paola Domingues Botelho, o evento é a concretização de ações pensadas entre as pastas da Saúde, Educação e o Ministério Público, desde 2021, para acolher às demandas de atendimento a crianças e adolescentes que apresentavam algum tipo de transtorno mental e que não eram direcionadas da maneira adequada.
“A proposta desse encontro é que possamos ter diversos atores da rede de atendimento discutindo casos práticos, e que isso possa se concretizar numa ação que mude a cultura dessa rede, para que se torne uma nova prática. Queremos que os atendimentos à saúde mental sejam mais eficientes, que atuem de forma mais humanizada e qualificativa, que é tudo o que a gente quer na ponta”, frisou.
A porta de entrada para os atendimentos em saúde mental é a Atenção Primária à Saúde (APS), que tem papel fundamental no cuidado das crianças e adolescentes e na adoção de medidas de proteção, prevenção e promoção da saúde mental nos territórios. Taynara Silva de Paula, coordenadora de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas da SES-MG, explicou os objetivos do Encontro.
“Esse é um evento focado na rede assistencial de saúde mental de crianças e adolescentes e foi construído de forma colegiada com as Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese-MG) e de Educação (SEE-MG), pensando nos profissionais que fazem esse atendimento. O objetivo é provocar a discussão do cuidado em saúde mental das crianças e adolescentes e formar profissionais multiplicadores para discutir essa pauta nos territórios de Minas”, enfatizou.
O conteúdo do III Encontro de Saúde Mental de Criança e Adolescente foi construído coletivamente por representantes da SES-MG, da Escola de Saúde Pública (ESP), da Sedese-MG, da SEE-MG e do MPMG. Ao longo do dia, foram realizadas cinco mesas de conversas, abordando temas como a atenção à crise em saúde mental, uso abusivo de álcool e outras drogas por crianças e adolescentes; medicalização/patologização da infância e juventude; autismo e deficiência intelectual; Rede de Atenção Psicossocial (Raps) e a intersetorialidade com políticas públicas que envolvam crianças e adolescentes; judicialização na saúde mental e a oferta de cuidado ao adolescente em conflito com a lei.
Linha de cuidado
Minas Gerais possui uma Política Estadual de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas, que foi aprovada em instâncias deliberativas pelo Conselho Estadual de Saúde e Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Minas Gerais (Cosems-MG) e instituída em 2016. Segundo Taynara Silva de Paula, a política estabelece as diretrizes para os profissionais que atuam na saúde mental, fortalece a Rede de Atenção Psicossocial (Raps) e cria mecanismos de avaliação, monitoramento e fiscalização dos pontos de atenção da Raps.
“A política é pautada nos fundamentos da reforma psiquiátrica brasileira, no cuidado e na liberdade, respeitando a singularidade e a subjetividade de cada indivíduo, uma vez que a SES-MG acredita que o cuidado em saúde mental se faz em liberdade”, destaca a coordenadora de Saúde Mental, Álcool e outras drogas da SES-MG.
Desde que a política estadual foi instituída, houve ampliação dos serviços oferecidos à população e a desinstitucionalização psiquiátrica, ou seja, fechamento de hospitais psiquiátricos e substituição dessas instituições pelos Centro de Atenção Psicossocial (Caps), que são de gestão municipal.
A Raps é composta por serviços da Atenção Primária à Saúde, atenção secundária e hospitalar. Ela é regionalizada no estado, com base territorial e comunitária, para estar mais próxima do usuário. Esses serviços atuam de forma articulada e intersetorial para garantir o cuidado efetivo ao usuário em sofrimento ou transtorno mental ou que tenha necessidades de saúde decorrentes do uso de álcool e drogas.
Os Caps oferecem atenção especializada e possuem equipe multiprofissional. Prestam atendimento prioritário às pessoas com sofrimento ou transtornos mentais graves e persistentes, em diversas modalidades, com atendimento integral, 24 horas por dia. Em todo o estado, há 51 Centros de Atendimento Psicossocial infanto-juvenis, que atendem a população de 266 municípios mineiros. Esses Caps são destinados ao atendimento exclusivo de crianças e adolescentes em sofrimento mental grave ou que façam uso abusivo de álcool e outras drogas.
De acordo com a Organização Pan Americana de Saúde (Opas), a estimativa é que de 10% a 20% dos adolescentes em todo o mundo sofram com problemas de saúde mental, em alguma instância, mas sigam sem receber o tratamento adequado. Além disso, o levantamento aponta que os transtornos comportamentais na infância são a sexta maior causa de carga de doença entre adolescentes. Dados da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), compilados em maio de 2022, apontam que 75% dos transtornos mentais se iniciam na infância e adolescência, sendo que metade deles se manifestam até os 14 anos de idade.