A visita de egressos do sistema prisional à exposição “Clara Nunes – Eu Sou a Tal Mineira”, no Museu da Moda, em Belo Horizonte, celebrou a conclusão do curso de crochê de alta costura promovido pelo Programa de Inclusão Social de Egressos do Sistema Prisional (PrEsp) da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp).
A formatura em forma de visita guiada aconteceu na terça-feira (12/3), com a presença de duas servidoras do PrEsp e as três sócias da empresa da área de moda Doisélles, parceira do programa.
O curso teve duração de um mês, com aulas duas vezes por semana. Os dois alunos que concluíram, Jussara do Carmo e o Márcio Júnior, já têm trabalho garantido na empresa parceira, com a vantagem de poderem confeccionar as peças em casa ou em qualquer outro lugar onde possam se concentrar na delicada técnica de produzir roupas femininas únicas e de alto luxo. A remuneração será feita por peça, o que possibilita a eles terem outras atividades.
As sócias da empresa, Raquell Guimarães, Ana Márcia Brant e Juliana Faillace, explicam que o crochê está em alta, muito valorizado, e os produtos são feitos à mão, não são produzidos em série.
Raquell Guimarães tem experiência com a mão de obra de detentos produzindo peças em tricô na área intramuros, mas hoje atua, junto às sócias, com aqueles que já cumpriram suas penas.
“As oportunidades para os egressos são muito limitadas. A riqueza desta relação com eles é que agora podemos mostrar não apenas o crochê, o tricô, o macramê, mas todo o universo da moda. Essa visita ao museu é para apresentar para os formandos o universo em que eles estão ingressando, como trabalhadores da moda”, explica Raquell.
O PrEsp e a empresa parceira se uniram para a construção e execução de uma proposta de trabalho que busca incidir diretamente em aspectos da qualificação profissional e geração de renda do público acompanhado pelo Programa da Segurança Pública.
Paralelamente, diante da disponibilidade do Museu da Moda em promover arte e cultura, a visita ao espaço contribui para estimular o sentimento de pertencer aos vários espaços públicos da cidade, e integrar essas pessoas como cidadãos livres, com seus direitos e deveres.
Descobertas
O público atendido pelo PrEsp é majoritariamente masculino, portanto, quando se traz uma proposta de crochê, para além de construir algo que se tenha a possibilidade de economia e renda, ocorre uma quebra de estigmas.
Jéssica Lariza, gestora do PrEsp Belo Horizonte, entende que os homens podem ocupar outros espaços, serem criativos.
“Houve uma adesão por parte do público masculino, mas também do feminino, que é bem menor no quantitativo dos acolhidos pelo programa. As diferenças impostas para atuação em determinadas atividades, muitas vezes, estão no campo do desconhecido. Quando é apresentado um ofício em que, independentemente de gênero, a pessoa se sente produtiva e se considera parte de um processo, ela quebra um distanciamento e pode descobrir a possibilidade de uma renda”, analisa.
Quem confirma esta avaliação é Márcio Júnior, de 38 anos, que observou atentamente e fotografou vários vestidos usados por Clara Nunes, expostos no Museu da Moda.
“Não podia me imaginar concluindo o curso e ter esta oportunidade de fazer uma atividade nova, e ainda ser remunerado”, conta. Márcio conseguiu criar um novo ponto no crochê, sem querer, ao tentar pôr em prática um que tinha aprendido havia poucas aulas. A criação do artesão já é motivo de orgulho para as sócias da empresa.
Jussara Gonçalves, 54 anos, teve experiência com as agulhas de crochê quando criança e na gravidez de uma filha retomou o trabalho, fazendo barras de pano de prato e um vestido vermelho de crochê.
“Aprendi muitas coisas novas no curso. Vai ser ótimo para ter uma renda, pois há preconceito com quem esteve preso. Fazer crochê é igual cozinhar, para sair bem feito é preciso amor e dedicação. Faço deste jeito”, pontua.