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Boas Festas
| Wilson Gorj
O aniversariante
Comemoravam o Natal, quando ouviram palmas.
- Quem será?
O anfitrião saiu para ver e encontrou ao portão um homem. A julgar pelo aspecto, só podia ser algum faminto andarilho.
- O que deseja?
A resposta veio com a maior naturalidade:
- Vim tomar parte da festa.
- Parte?
- Por que não? Afinal, o aniversariante sou eu.
O dono da casa olhou-o com pena. "O sujeito é maluco." E depois, querendo tirar proveito da situação, provocou-o:
- É mesmo? Então me prove.
- Tens pouca fé.
- Café? Tenho, sim.
- Não quero café. Traga-me pão!
- Ah, já entendi. O milagre da multiplicação...
- Duvida?!
"Que estratégia desnecessária para matar a fome", tornou a pensar. "Bastasse pedir, ora."
E sarcástico:
- Espere aí, Jesus. Volto logo.
Segundos depois, retornou com algo melhor.
- Não temos pão.
E com um riso debochado, entregou o panetone.
- Agora o senhor faça o favor de multiplicá-lo em outro lugar.
Dizendo isso, deu as costas ao desconhecido e voltou para junto dos convidados.
A comemoração natalina seguiu noite adentro.
Quando o primeiro conviva deixou a festa, estancou-se, pasmado, diante do portão. Não havia por onde sair. Empilhados na calçada, centenas de panetones isolavam aquela casa como um muro de Natal.
Positivo
Faltavam poucos dias para o Natal, quando topei com Papai Noel. Estava bêbado. Parado na minha frente, pediu-me um trocado. Dei o dinheiro e brinquei: "Espero que neste ano o senhor se lembre do meu presente". Ele me olhou, sério. "Não se preocupe, rapaz", respondeu. "Seu presente está reservado." E, com o polegar sinalizando para cima, completou: "Pode acreditar que desta vez ele vem".
Antes de partir, ele ainda se voltou para mim e repetiu. "Virá, sim. Desta vez não falha". Sua mão mantinha o polegar levantado. "Um belo presente."
*
Dias depois, eu já não me lembrava mais desse episódio. Estávamos todos em casa, curtindo a noite de Natal.
Quando ficamos a sós, minha mulher me entregou um embrulho bonito, enlaçado por uma fita vermelha. "Seu presente", sussurrou ao meu ouvido, enquanto nos abraçávamos.
Desembrulhei. Dentro, apenas uma folha timbrada com algumas informações. Olhei com atenção: trazia o resultado de um exame. De imediato veio-me à lembrança o sinal que o bêbado fizera em nosso encontro.
Confesso que chorei. Lágrimas de um adulto que voltava a crer em Papai Noel.